TJPE Veda Retenção de Mercadorias como Coação Indireta ao Pagamento
Por Elen Moreira 21/03/2023 as 11:30
Direito Civil Direito Processual Civil Direito Administrativo
Ao julgar os embargos de declaração opostos em face do acórdão que possibilitou ao Estado de PE a apreensão de mercadorias para fiscalização e proibiu a retenção como forma indireta de coação ao pagamento do tributo, o Tribunal de Justiça de Pernambuco manteve a decisão assentando que a Fazenda Pública deve dispor dos meios legais para a cobrança dos débitos fiscais.
Entenda o Caso
Os Embargos de Declaração foram opostos pelo Estado de Pernambuco em face do Acórdão que deu parcial provimento ao Agravo de Instrumento para reformar a decisão agravada.
O embargante afirmou que:
[...] o Acórdão foi contraditório ao citar na fundamentação as hipóteses legais em que o Estado poderá proceder com a apreensão das mercadorias para fiscalização e, quando da elaboração do dispositivo reformou a decisão agravada para permitir que o Fisco proceda com as apreensões regularmente das mercadorias, no exercício de sua atividade fiscalizatória para apuração de eventuais ilícitos tributários, sem que para isso, citasse as hipóteses legais previstas em lei.
E, reiterou: “[...] na parte dispositiva ficou autorizada a apreensão das mercadorias para fiscalização independentemente de estarem ou não no rol previsto em lei como possível de apreensão para tanto, dando ensejo à contradição ora apontada”.
Decisão do TJPE
A 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, com voto do Desembargador Relator Erik de Sousa Dantas Simões, manteve o provimento parcial do Agravo de Instrumento.
De início, ressaltou que a questão foi devidamente apreciada pela 1ª Câmara de Direito Público quando reformou a decisão agravada “[...] no que tange à abstenção do Fisco em realizar novas apreensões de mercadorias da empresa impetrante/agravada, devendo ocorrer a fiscalização regular para apuração de eventuais ilícitos tributários”.
Na ocasião, passou-se a determinar “[...] que o Estado procedesse com as apreensões sempre que necessário proceder com a fiscalização regular para apuração de eventuais ilícitos tributários”.
Ainda:
Diante disso, o ordenamento jurídico permite a apreensão de mercadorias para apuração de tais fatos e para que se lavre o respectivo auto de infração, constituindo o crédito tributário, a fim de possibilitar a respectiva cobrança.
No entanto, ressaltou a da Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal e esclareceu:
Apurados os elementos necessários à constituição do crédito tributário, com a lavratura do auto de infração, não assiste razão ao Fisco para a retenção das mercadorias apreendidas, caracterizando sanção política, pois coage o contribuinte de forma indireta ao pagamento do tributo quando a Fazenda Pública dispõe de meios próprios, legalmente previstos, para a cobrança dos débitos fiscais.
Por fim, destacou a ausência de vício a ser sanado e a inadequação da via processual para reapreciação da questão.
Número do Processo
0017387-77.2022.8.17.9000
Ementa
PROCESSO CIVIL. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. APREENSÃO DE MERCADORIAS COMO MEDIDA DE COBRANÇA DO TRIBUTO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 323 DO STF. PRETENSÃO DE OBSTAR FUTURASAPREENSÕES DE MERCADORIAS COMO FORMA DE COBRANÇA DE TRIBUTOS. CARÁTER GENÉRICO. IMPROCEDÊNCIA. INEXISTÊNCIA DA CONTRADIÇÃO APONTADA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. DECISÃO UNÂNIME. 1.Conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, os embargos de declaração são cabíveis quando a decisão contiver obscuridade, contradição, omissão ou erro material, sendo certo que a atribuição de efeitos infringentes constitui medida excepcional apenas para atender a necessidade de solucionar tais defeitos. 2.In casu, a questão a ser resolvida foi devidamente apreciada por esta 1ª Câmara de Direito Público, chegando-se a conclusão de que a decisão recorrida necessitava ser corrigida no tocante à determinação para que o Fisco se abstivesse de realizar novas apreensões de mercadorias da empresa, passando a determinar que o Estado procedesse com as apreensões sempre que necessário proceder com a fiscalização regular para apuração de eventuais ilícitos tributários. 3.Consta do Acórdão ora embargado que a nota fiscal está configurada como o documento hábil a assegurar condições para a fiscalização detectar a ocorrência do fato gerador de ICMS. 4.Registrou-se que a ausência ou a invalidade do documento fiscal possibilitará que a Fazenda retenha as mercadorias para que seja constatada a irregularidade, lavrando-se o auto de infração respectivo, constituindo o crédito tributário e possibilitando a respectiva cobrança, observado o devido processo legal. 5.Nesse contexto, restou consignado que verificada a ausência ou a invalidade da nota fiscal, a apreensão de mercadorias é um procedimento amparado pela lei, necessário para que a Administração Tributária exerça seu dever de ofício sem que haja afronta aos preceitos constitucionais. 6.Diante disso, o ordenamento jurídico permite a apreensão de mercadorias para apuração de tais fatos e para que se lavre o respectivo auto de infração, constituindo o crédito tributário, a fim de possibilitar a respectiva cobrança. 7.Apurados os elementos necessários à constituição do crédito tributário, com a lavratura do auto de infração, não assiste razão ao Fisco para a retenção das mercadorias apreendidas, caracterizando sanção política, pois coage o contribuinte de forma indireta ao pagamento do tributo quando a Fazenda Pública dispõe de meios próprios, legalmente previstos, para a cobrança dos débitos fiscais. 8.Com isso, fica evidente que o entendimento disposto por esta Câmara no voto estabeleceu-se no sentido de que o Fisco no exercício da fiscalização que lhe compete pode reter mercadorias para a apuração de irregularidades quando a documentação fiscal não for apresentada ou quando houver alguma mácula na sua emissão. Isso é legalmente permitido para que a Administração Tributária Estadual lavre o respectivo auto de infração, constituindo o crédito tributário, a fim de possibilitar a respectiva cobrança. 9.Após tais conclusões, o voto traz a regulamentação do processo administrativo tributário estadual para demonstrar a forma como está disposto na lei o procedimento a ser seguido nessas hipóteses. 10.Fez-se constar, portanto, que a Lei nº 10.654/91 disciplina o processo administrativo tributário no Estado de Pernambuco e, em seu art. 2º, I, ‘a’ e ‘b’, dispõe que o referido processo se iniciará, de ofício, com a lavratura do auto de infração ou de apreensão. 11.Ainda, que o art. 31 do diploma legal acima citado prevê que o auto de apreensão será lavrado sempre que as mercadorias forem encontradas em situação irregular, considerando irregulares aquelas que se encontrem em qualquer das seguintes situações: I) desacompanhada de documento fiscal próprio; II) acompanhada de documento inidôneo, nos termos previstos na lei; III) em local não inscrito no CACEPE, quando a inscrição for exigida na legislação; IV) desviada do destino referido no respectivo documento fiscal. 12.Asseverou que, sendo o Auto o instrumento que lança o crédito tributário de ofício, a apreensão das mercadorias com o fito de cobrar imposto por via oblíqua é rechaçada pela doutrina e jurisprudências pátrias, somente devendo permanecer apreendidas pelo tempo necessário para a lavratura do instrumento fiscal. Assim, não pode o Poder Judiciário impedir, indiscriminadamente, que o Estado continue a promover a sua atividade fiscal típica e regular, no sentido de aferir a situação cadastral do contribuinte, impor eventual infração tributária ou mesmo de cobrar o tributo quando devido. 13.Com esses argumentos, resolveu-se a celeuma sobre o não cabimento da determinação para que o Estado se abstenha de efetuar futuras apreensões de mercadorias, restando claro que não pode o Poder Judiciário impedir, indiscriminadamente, que o Estado continue a promover a suaatividadefiscal típica e regular, no sentido de aferir a situação cadastral do contribuinte, impor eventual infração tributária ou mesmo de cobrar o tributo quando devido. 14.A pretensão de obstar futuras apreensões de mercadorias como forma de cobrança de Tributos não é possível, ante o caráter genérico da determinação, e foi isso que restou decidido no Acórdão ora recorrido. 15.A citação da lei do processo fiscal administrativo do Estado serviu como fundamentação para demonstrar as disposições legais a respeito do procedimento a ser seguido quando da apreensão das mercadorias para fiscalização, não havendo que se falar em contradição. 16.Como se vê, não há qualquer vício a ser sanado, mas, sim, mero inconformismo da parte Embargante com o julgado, revelando sua intenção de ver reapreciado e acolhido o pleito já debatido neste Órgão Colegiado. Ora, o presente recurso não é a via processual adequada para a obtenção do fim almejado, até porque esta Corte não é instância revisora de seus próprios julgados. 17.Registre-se, por derradeiro, que oCPC, em seuart.1.025, adotou o prequestionamento implícito, considerando incluídas no Acórdão, portanto, todas as matérias suscitadas no recurso, mesmo na hipótese de rejeição dosembargosdedeclaração. 18.Embargos de Declaração rejeitados. 19.Decisão Unânime.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento nº 0017387-77.2022.8.17.9000, em que são partes as acima indicadas, acordam os Excelentíssimos Desembargadores que compõem a 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Pernambuco, por unanimidade de votos, em rejeitar os Embargos de Declaração, nos termos do voto do Relator, estando tudo de acordo com as notas Taquigráficas, votos e demais peças que passam a integrar este julgado. Recife, data conforme registro de assinatura eletrônica. Des. Erik de Sousa Dantas Simões Relator
Fonte: Instituto Direito Real